25 ANOS DA MISSÃO VOYAGER

O DISCO INTERESTELAR DA VOYAGER

Palestra apresentada no dia 28 de setembro de 2002 no Observatório - Setor de Astronomia - do Centro de Divulgação Científica e Cultural da Universidade de São Paulo - Campus - São Carlos -SP., pelo monitor Aldo Loup.

A missão Voyager foi o mais bem sucedido projeto de exploração planetária até o momento. As duas sondas voyager 1 e Voyager 2 exploraram quase metade do Sistem Solar (Júpiter, Saturno, Urano e Netuno) e reescreveram livros e livros de Astronomia.

Quando o plano da missão foi decidido já estava claro que, mais uma vez, naves espaciais fabricadas pelo ser humano sairiam do Sistema Solar. As duas primeiras a serem lançadas com esse destino foram as Pioneer 10 Pioneer 11, que tambêm passaram por Júpiter e Saturno e hoje, ao igual que as Voyagers, se encontram na fronteira do Sistema Solar. Junto com o lançamento das Pioneer em 1972 e 1974 aconteceu a primeira tentativa séria de nossa raça em comunicar-se com seres extraterrestres, se é que eles existem: as duas Pioneer levavam cada uma delas uma placa com uma identificação, escrita em linguagem científica, que indicava o lugar de origem e a data de lançamento desses artefatos, com a esperança de que seres extraterrestres inteligentes talvez possam descifra-las e saber que ao redor da estrela que nós chamamos de Sol houve uma vez seres que olhavam para o céu e se maravilhavam.

Para a missão Voyager, em 1977, já houve mais tempo e mais verba para planejar uma mensagem mais completa, mais ousada e não apenas uma "placa de carro" lançada às estrelas. Foi decidido então enviar informação acerca de nosso mundo e de nossa civilização.

O sistema de armazenamento dos dados deviam ser extremanente estável e de alta durabilidade, para aumentar as chances de que a mensagem chegasse intacta. O melhor então era usar novamente placas metálicas gravadas. Como deviam ser leves e conter grande quantidade de informação, não foi encontrda melhor alternativa do que uma tecnologia bem conhecida e estabelecida na época: discos LPs. O disco LP armazena informação em gravuras que depois uma agulha se encarrega de transducir em sinais eletromagnéticos. Pelo mesmo procedimento, além de gravar soms, também pode-se gravar dados e inclusive imagens. Resolveu-se então enviar imagens, junto com sons e música da Terra.

Os discos finais eram duas matrizes metálicas de cobre coladas para dar os dois lados do LP, e depois recobertas de ouro para diminuir a oxidação. Como no espaço exterior praticamente não há degradação, estes discos são os artefatos tecnológicos com maior tempo de garantia do fabricante: 1 milhão de anos. Acima dos discos foi colocada uma capa de alumínio e ouro com uma dupla função: protege dos impactos dos micrometeoros e contém as instruções para tocar o disco, além de ter identificações parecidas com as das Pioneer. Um pouco de plutônio radioativo ajudará na datação.

O segredo para decodificar os discos está na suposição de que as naves Voyager devem ser localizadas e resgatadas no espaço exterior: elas não sobreviveriam a um pouso num planeta. Só uma civilização avançada tecnologicamente pode fazer isto, e se entende que esse tipo de civilização também tem amplos conhecimentos científicos. Um desses conhecimentos deve ser o átomo de hidrogênio, o mais abundante no Universo. O átomo de hidrogênio tem só um próton e um elétron que gira em volta. Quando esse elétron recebe ou perde energia, ele muda de orientação. Nessa mudança, ele absorve ou emite a energia em forma de um sinal eletromagnético, que tem uma freqüência constante ( 1,420 MHz, ou 1,420 milhões de ciclos por segundo) e um comprimento de onda constante ( 21 cm). É isto o que está gravado na capa do disco e com isso se espera passar informação de tempo e comprimento aos cientistas extraterrestres. Essas constantes são depois multiplicadas usando códigos binários, que só tem dois símbolos e é muito fácil de aprender. A capa então tem diagramas de como usar a agulha no disco, a que velocidade este deve ser rotacionado e como é o sinal que deve ser captado, assim como a maneira de organizar esse sinal para ler a mensagem.

Como esperado, muitos cientistas aqui na Terra conseguem descifrar sem dificuldades essas instruções.

A mensagem do disco consiste basicamente em imagens de um lado e sons e música do outro lado. O sumário é o seguinte: 116 ilustrações, os dois primeiros compassos da Cavatina de Beethoven, saudações do presidente dos Estados Unidos, lista do Congresso dos Estados Unidos ( que deu a verba para a missão), saudações do Secretário Geral das Nações Unidas, saudações em cinqüenta e cinco línguas, saudações de delegados da ONU, sons da Terra e duas horas de uma cuidadosa seleção musical.

As imagens compreendem em primeiro lugar uma definição de códigos científicos que ajudarão a entender melhor o resto. Depois vem informação acerca de nosso Sistema Solar. Há detalhes acerca da bioquímica terrestre, pois há possibilidade de que eles estejam baseados numa bioquímica muito diferente ( ou não?). As imagens seguintes mostram detalhes de células e de anatomia humana. Há informação sobre a reprodução do ser humano, e diferentes estágios de crescimento na vida humana.

Depois vem informação acerca da geologia da Terra, que ajudará a entender melhor nosso dinâmico planeta.

A seguir vem informação acerca de outros seres vivos na Terra: plantas e animais.

Posteriormente, novamente há informação acerca do ser humano, desta vez centrada na cultura e na civilização: costumes humanos primitivos, esportes, educação, alimentação, construções humanas, indústria, medicina, transportes e um pouco dos nossos avanços em Astronomia e Astronáutica. Mais acerca de nossa Ciência e Tecnologia está contida na propria nave que os extraterrestres deverão ter capturado.

Resolveu-se não enviar cenas de guerra, fome e outras vergonhas humanas por medo a má interpretação. E afinal das contas, estamos nos apresentado.

Mas as ultimas imagens mostram algo de bonito: um pôr-do-Sol e músicos e seus instrumentos, junto com uma partitura (as notas correspondem justamente aos primeiros compassos da música que vem a seguir).

A música foi selecionada tentando representar a maior parte das culturas presentes na Terra atualmente. Há uma possibilidade de que seres inteligentes tenham uma habilidade natural para a música, pois ela inclui muitos elementos presentes na matemática, como ritmos, períodos, freqüencias, etc.

Talvez a parte mais misteriosa da mensagem seja justamente a parte dos sons da Terra, e ainda mais, as vozes humanas. Praticamente não se considera que haja possibilidade de que eles entendam o que estamos falando, mas não é possível pensar em enviar para as estrelas uma mensagem desse tipo sem um toque pessoal e humano.

Mas a verdadeira mensagem do discos das Voyager é que neste canto obscuro da Galaxia estamos nós, seres com um enorme desejo de aprender, e que queremos fazer amizade com nossos irmãos das estrelas que compartilham conosco este Universo, se é que não estamos sozinhos. As chances de sucesso desta missão final das naves Voyager são verdadeiramente mínimas. São como mensagens numa garrafa lançadas ao mar. Talvez elas acabem vagando durante milhões de anos antes de ser encontradas num remoto lugar por alguém, e quando isto acontecer nós talvez já não estéjamos mais aqui. Mas a informação contida nas Voyager serão um testemunho de quem nós fomos algum dia.